Ao participar, nesta quarta-feira (8), de audiência pública promovida pela Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados, a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Nancy Andrighi sugeriu aperfeiçoamentos ao texto do Projeto de Lei 1.954/2022, que prevê indenização pela perda de tempo do consumidor, ainda que não haja dano moral ou material.

De autoria do deputado Carlos Veras (PT-PE), o projeto trata o tempo como um bem de valor jurídico essencial e autoriza o Poder Judiciário a aplicar penas que considerem, por exemplo, a faixa etária do consumidor e suas condições de saúde.​​​​​​​​​

Ministra Nancy Andrighi participa da audiência pública na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados. | Foto: Gustavo Lima/STJ
Nancy Andrighi – que compõe a Terceira Turma e a Segunda Seção do STJ, especializadas em direito privado – falou sobre a evolução do direito do consumidor na legislação brasileira e na jurisprudência da corte, elogiou a iniciativa da apresentação do projeto e propôs melhorias ao texto.

De acordo com a ministra, a Constituição de 1988 pacificou parcialmente os debates acerca da possibilidade de reparação dos danos imateriais, pois alguns temas ainda são tratados de forma tímida pelo ordenamento jurídico, como o tempo perdido pelos cidadãos.

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"É inegável que o tempo excessivo de permanecer em uma fila, aguardando um atendimento, retira indevidamente da vida útil do cidadão o tempo que, sem dúvida alguma, é um valor que ele poderia utilizar em outras tarefas", destacou.

Proposta de integração do projeto ao Código de Defesa do Consumidor

Nancy Andrighi citou julgados do STJ que reconhecem o dano moral coletivo em casos de descumprimento de normas municipais sobre o tempo máximo de espera nas filas de agências bancárias. Em relação aos processos individuais, ela lembrou que a invocação de leis locais sobre o tema, em regra, não justifica a indenização do consumidor, mas a jurisprudência admite exceções.

"Elas ocorrem quando há excessiva espera do consumidor associada a outros constrangimentos, como falta de água, falta de banheiro, ou ainda quando o consumidor é hipervulnerável" – explicou, dando o exemplo de grávidas, idosos e pessoas com deficiência.

Entre as sugestões para aperfeiçoar o projeto, Nancy Andrighi comentou que a nova lei seria mais efetiva se fosse integrada ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), em vez de se tornar mais uma norma esparsa.

Segundo a ministra, o texto legislativo também deveria dar destaque aos direitos dos hipervulneráveis, incluindo as pessoas com dificuldade para utilizar plataformas virtuais.

Perda de tempo do consumidor deve dispensar prova de dano

Por fim, ela alertou que a lei deve evitar termos dúbios que deem margem a novas discussões judiciais. "Temos de dizer que o desperdício de tempo prescinde de prova do dano. É preciso provar apenas o que é necessário. De resto, a lei tem que ser implacável. Se não escrevermos expressamente isso, vai continuar havendo dúvida", concluiu.

Além de parlamentares, participaram da audiência pública Vitor Hugo do Amaral Ferreira, diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (Senacon); Bruno Reisei Toguchi, presidente da Comissão Especial de Direito Bancário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Amaury Oliva, diretor-executivo de Sustentabilidade, Cidadania Financeira, Relações com o Consumidor e Autorregulação da Federação Brasileira de Bancos (Febraban); Christian Printes, coordenador da área jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec); Marcos Dessaune, jurista e autor da teoria do desvio produtivo do consumidor; e Luciano Timm, professor de direito da Fundação Getulio Vargas (FGV).

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